quinta-feira, outubro 30, 2008

Setor de educação não faz "lição de casa", afirma KPMG

30/10/2008 - Concorrência acirrada, uma onda de aquisições e quatro aberturas de capital entre empresas de ensino superior ainda não foram suficientes para alterar as práticas das instituições de capital fechado no que diz respeito à falta de controle financeiro e informalidade. Essa é a avaliação do sócio da área de auditoria da KPMG, Marcos Boscolo, especializado em educação.

"Em relação a outros setores, as empresas educacionais têm uma lição muito grande a fazer", afirmou Boscolo, na terça-feira, durante evento gratuito para empresários de ensino superior promovido pela KPMG, que vende serviços de auditoria e consultoria. "Ainda há problemas realmente básicos na contabilidade de muitas delas."

Segundo Boscolo, as empresas educacionais freqüentemente misturam despesas da instituição e dos seus controladores, deixam de registrar parte dos gastos e despesas, não elaboram balancetes periodicamente e usam práticas rudimentares de contabilidade. Também é comum, diz o executivo, que não façam provisões para perdas com processos judiciais e que desconheçam seus custos operacionais. "Em vez de estabelecer o valor do curso com base no quanto o programa custa para a empresa, a mensalidade é definida pelo preço da concorrência", conta.

A precariedade desse controle de custos resulta numa oferta de cursos deficitários, que deixam as instituições em situações financeiras problemáticas. "Essa é a falha mais crítica das empresas de ensino superior", afirma Rodrigo Capelato, diretor executivo do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo (Semesp). "A gestão financeira é chave num momento de consolidação e concorrência acirrada", diz.

Há cerca de seis anos, segundo Capelato, as instituições de ensino começaram a elevar a oferta de vagas em ritmo superior ao crescimento da demanda, de forma que a disputa por alunos e as guerras de preços aumentaram. A competição se acirrou ainda mais depois que algumas empresas conseguiram se capitalizar e crescer por meio de aquisições.

O número de transações se multiplicou desde que quatro companhias de educação abriram capital na bolsa de valores - Anhanguera, Estácio, Kroton e SEB -, no ano passado. Até setembro de 2006, conforme dados da KPMG, apenas duas transações haviam sido registradas. No mesmo período de 2007, o número já havia saltado para 18 e, até setembro deste ano, já são 41 - só outubro registrou seis negócios. Educação é o terceiro setor com maior número de aquisições no ano, atrás apenas dos segmentos de tecnologia e de alimentos e bebidas.

A precariedade dos balanços e dos controles dentro das instituições de ensino já foi apontada diversas vezes como uma das barreiras para operações de aquisição e até à sobrevivência das empresas. "No início da negociação, é tudo lindo. Mas quando você começa a analisar a empresa à venda, descobre que ela paga os professores por fora, que os números não batem e há prejuízo", conta Chaim Zaher, presidente da SEB, cuja aquisição mais recente, a Praetorium, foi anunciada nesta semana.

Segundo Boscolo, quem compra assume a responsabilidade de reorganizar a empresa comprada, mas desconta esse trabalho no preço pago pelo negócio.

Carlos Simões, sócio da KPMG na área de consultoria financeira, afirma que os números distorcidos das empresas são um obstáculo para fundos de participações. "Alguns fundos de private equity começam analisando cem empresas para comprar, mas só duas ou três chegam ao processo final de negociação", diz Simões.

Apesar das barreiras, esses fundos permanecem interessados em adquirir empresas de educação e têm aproximadamente R$ 3 bilhões reservados para investimentos no setor. Para Simões, os fundos tornaram-se uma fonte importante de recursos num momento em que uma crise de liqüidez vai tomando forma. Entre aqueles que já investiram no setor estão o GP, com participação na Estácio; o UBS, na Fanor, e o Pátria, na Anhanguera.

Pressa para abrir capital foi desgastante, diz SEB

O afã para lançar ações na bolsa de valores custou caro a Chaim Zaher, o presidente e principal acionista da SEB, companhia de educação dona dos sistemas de ensino COC. "Abrimos capital num tempo curto e foi muito desgastante", disse Zaher durante um evento da KPMG para empresários do ensino superior. "IPO deveria se chamar "IPirou", porque você pira mesmo", concluiu ele, sem papas na língua, em referência à sigla da expressão "Inicial Public Offering", que significa oferta inicial de ações em inglês.

Numa atitude pouco vista entre executivos, Zaher admitiu que a SEB correu contra o tempo para aproveitar a onda recorde de aberturas de capital em 2007. Em um ano, a SEB teve que fazer uma profunda reorganização das empresas que compõem o grupo e de suas informações financeiras. O tempo ideal de preparação, segundo Zaher, seria de pelo menos dois anos.

A quantidade de trabalho e o tempo escasso não foram as únicas coisas que surpreenderam Zaher. Para viabilizar a reestruturação, ele pagou R$ 31 milhões do próprio bolso, a contragosto. Do total, R$ 12,8 milhões serviram para zerar prejuízos acumulados de algumas empresas da holding e outros R$ 6 milhões foram destinados à aquisição de uma sociedade anônima que serviu de base para a estruturação da SEB.

Os outros R$ 12,3 milhões que Zaher pagou eram recursos que ele, enquanto pessoa física, havia tomado emprestado de suas empresas. "Essa história de separar o que é da pessoa jurídica e o que é da pessoa física é mesmo fundamental", disse ele à platéia de empresários de educação. E deu um conselho: "mude, antes que você seja obrigado a mudar". Mais cedo, durante o evento, a falta de separação entre bens e despesas que são da companhia e aqueles que são do controlador havia sido apontada como problema comum nas empresas de educação fechadas. A KPMG audita os balanços da SEB.

Por fim, Zaher afirmou que, apesar do desgaste, não se arrependeu de ter levado sua companhia à bolsa. "Tivemos sorte de sermos muito bem assessorados e não me arrependo. Agora, com essa crise de crédito, ter em caixa uma parte dos recursos da oferta dá tranqüilidade", disse. A SEB lançou suas ações em outubro de 2007 e levantou R$ 288,75 milhões na oferta primária e R$ 123,75 milhões na secundária. No fim do segundo trimestre deste ano, a empresa tinha caixa líquido de R$ 163,7 milhões. As ações da SEB caíram 19,2% ontem, contra alta de 4,37% no Ibovespa. (RC



FONTE: VALOR ECONOMICO

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