segunda-feira, outubro 06, 2008

Ensino e saúde crescem, mas falta qualidade

06/10/2008 - Ensino e saúde crescem, mas falta qualidade

Após a Constituição, avanço na cobertura desses serviços foi incentivado pelo governo federal, dizem especialistas

FLÁVIO FERREIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

O processo de descentralização administrativa preconizado pela Constituição de 1988 estendeu os serviços básicos de saúde e educação a quase todo o país, mas ainda é preciso levar qualidade aos sistemas públicos municipalizados e estadualizados nos últimos 20 anos.
A conclusão é de pesquisadores do Centro de Estudos da Metrópole do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento), que avaliaram o processo de transferência de competências entre as esferas do Poder Executivo do país nas últimas décadas.
Marta Arretche e Eduardo Marques, membros do centro e professores do Departamento de Ciência Política da USP, afirmam que o avanço na cobertura dos serviços públicos de saúde e educação foi impulsionado por uma atuação direta do governo federal, seja por meio de programas de incentivo, com repasses de recursos, seja por uma forte regulamentação, principalmente quanto aos valores mínimos de investimento nessas áreas.
Atualmente, os prefeitos são obrigados pela legislação a aplicar 25% do Orçamento em educação e 15% em saúde.
Segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 2.450 dos 4.650 dos municípios existentes no país em 1992 não possuíam postos ou centros de saúde. Em 2005, o número de cidades sem os postos era de apenas seis, em um universo de 5.558 municípios, de acordo com o IBGE.
Os números da cobertura na educação básica também melhoraram nas últimas duas décadas. A taxa de atendimento escolar, que consiste no percentual da população que se encontra matriculada na escola, para as crianças com idade entre 7 e 14 anos, era de 80,9% em 1980. Em 2000, o índice já era de 96,4%, segundo os registros do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), órgão do Ministério da Educação.
Porém, os serviços de educação e saúde que chegam aos brasileiros ainda estão longe de atingir os padrões de qualidade dos países desenvolvidos, segundo os pesquisadores.
"Mesmo nas políticas sociais em que se massificou o acesso da população, isso se deu com qualidade muito baixa. A política de educação fundamental é um exemplo disso. Foi reduzido o número de crianças fora da escola, mas a qualidade é bastante ruim", afirma Marques.
"Hoje os desafios das políticas sociais estão mais concentrados na melhoria da qualidade do que no aumento da quantidade, embora continuem existindo lugares em que há ausência de serviços ou serviços deficitários em termos quantitativos", segundo o professor.
Arretche cita uma exemplo europeu para ilustrar a complexidade em se alcançar altos padrões de qualidade nos serviços públicos. "A Inglaterra, no começo do século 20, levou quase 40 anos para resolver simultaneamente o problema da cobertura e da qualidade", diz a pesquisadora.

Regulação federal
Segundo Arretche, um aspecto pouco lembrado no processo de descentralização foi o significativo papel do governo federal na coordenação e regulação das políticas sociais, principalmente a partir dos governos de Fernando Henrique Cardoso, entre 1995 e 2002.
"Nos setores de políticas em que não houve esse tipo de coordenação, como em transporte público e saneamento básico, os avanços foram muito desiguais nas diversas regiões do país", diz Marques.
"Há políticas que são descentralizadas, mas não reguladas, como transporte e infra-estrutura urbana. Estas não são priorizadas. É muito baixa a prioridade mesmo em grandes cidades, que possuem uma necessidade enorme. É por isso que a situação do transporte e da infra-estrutura urbana é caótica em qualquer grande cidade brasileira", afirma Arretche.
Fonte: Folha de São Paulo

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