28/07/2008 - Jovens de hoje não vinculam o curso universitário a uma carreira, diz consultor, o que traz risco de frustração Rafael Sigollo Aliar vocação com boas oportunidades no mercado de trabalho é a melhor forma de escolher a profissão. Mas, para um adolescente de 16 ou 17 anos, decidir em qual área irá trabalhar para o resto da vida, não é uma decisão assim tão fácil. Além da falta de maturidade, os especialistas apontam um outro agravante: a falta de interesse. “Os jovens dedicam pouquíssimo tempo ao seu futuro profissional. Muitos deixam para pensar nisso na última hora e acabam se arrependendo depois”, afirma o superintendente-geral do Instituto Via de Acesso, Ruy Leal. A psicóloga e orientadora profissional do Instituto Ser, Marilu Diez Lisboa, concorda: “O adolescente não pensa em uma carreira, e sim em um curso universitário. Ele não associa com seriedade essa escolha com seu futuro e procura o curso sem um plano, sem um objetivo definido.” Para ajudar na escolha, Fernando Cardoso, sócio-diretor da Integração - Escola de Negócios, defende maior participação das escolas, propiciando palestras, debates e visitas monitoradas em diversos locais de trabalho. “O estímulo fornecido pelo ensino médio pode fazer a diferença”, garante. “A escola se preocupa apenas em fazer o aluno passar no vestibular. Agora, em qual curso, é problema dele.” PAIS E AMIGOS A influência dos pais e dos amigos também é outro ponto que deve ser considerado. Ela será prejudicial se o jovem não tiver inclinação para determinada área e apenas entrar nela por pressão recebida. Sentir-se forçado. “Os pais ainda preferem profissões mais tradicionais como Medicina, Direito e Engenharia, mas precisam entender que existem muitas outras opções hoje no mercado”, diz Cardoso. Marilu aponta que o aspecto financeiro tem seduzido muitos jovens para determinadas profissões e, algumas vezes, são até mesmo o motivo principal da escolha. “Essa juventude está muito fixada na questão do ‘ter’, que não podemos desprezar, uma vez que vivemos em uma sociedade de consumo. Mas existem também o ‘ser’ e o ‘fazer’ e precisa haver uma correspondência entre todos eles.” Na opinião de Ruy Leal, os jovens de hoje ainda estarão numa fase altamente criativa e produtiva quando tiverem 60 anos de idade. “Quem escolhe uma profissão com dúvida ou sem saber onde está se metendo vai viver infeliz esse tempo todo?”, pergunta. Para o psicanalista e professor de Psicologia da ESPM, Pedro de Santi, se a profissão for escolhida levando em conta apenas o mercado, certamente o final não será feliz. “Esse é um fator a ser considerado, mas não o único. O mercado é cíclico e pode mudar radicalmente em quatro ou cinco anos. Quando você se forma, já não encontra mais aquele cenário que havia quando ingressou na universidade.” ORIENTAÇÃO Leal enfatiza que a escolha da profissão nunca foi tão importante quanto neste século. “Antes as mudanças eram lentas; hoje são violentas. É preciso, portanto, amar o seu trabalho para estar sempre atualizado e disposto a se adequar e se adaptar a ele”, afirma. Mesmo assim, o risco de uma decisão errada sempre vai existir, mas pode ser reduzido. Para isso, os especialistas aconselham os adolescentes a terem conversas com profissionais experientes e com professores, além de fazer um plano de vida e buscar o auto-conhecimento. Nesse ponto, a orientação vocacional pode ser uma boa alternativa. Mas cuidado: não se trata de testes simples e rápidos pela internet. “A orientação vocacional evoluiu e mudou muito, assim como o mercado de trabalho. É um processo que às vezes é compartilhado até com a família do jovem e pode chegar facilmente a dez sessões”, revela Marilu, que coordena um curso para formar orientadores profissionais. O professor, pesquisador e autor de livros Roberto Macedo alerta que um programa de orientação vocacional, se não for bem estruturado, pode mais atrapalhar do que ajudar: “Eles são muito focados nas profissões em si, ignorando que cada vez mais as pessoas vão trabalhar em ocupações que não são típicas delas. ” Macedo, inclusive, defende uma proposta de adiar a escolha da profissão para depois do vestibular. Assim, vários cursos teriam um ciclo básico comum de dois anos, e a escolha da especialização ou profissão só a partir do terceiro, quando o jovem estará mais maduro e melhor informado. “Cursos de Economia, Administração, Contabilidade e Relações Internacionais, por exemplo, poderiam entrar nesse esquema. Depois de completar um deles, o estudante também poderia voltar à escola e fazer outro em apenas dois anos”, diz Macedo. MAIS OPÇÕES Se mesmo pesquisando e procurando se informar o jovem não se sentiu muito atraído por nenhuma das opções, uma das saídas é fazer um curso que possibilita um maior leque de especializações e atuações como Administração e Comunicação. “Como os caminhos são muitos, conforme vai fazendo o curso o aluno ganha mais tempo até achar uma função pela qual se identifica mais”, diz Pedro de Santi. Não é incomum também começar um curso e depois de um ano perceber que não era bem aquilo que se queria. Nesse caso, é melhor começar outro, desta vez, mais consciente. “Essa primeira desistência é compreensível, mas a pressão para que a segunda escolha esteja certa será enorme”, alerta de Santi. Para Marilu, são poucos os jovens que têm a chance de freqüentar uma universidade e escolher a profissão no Brasil e, por isso, é preciso dar mais importância a essa decisão. “Se esse é o seu caso, faça uma escolha cuidadosa, que valha a pena para você e para a sociedade.” Veja como dois jovens fizeram suas escolhas O estudante Bruno Starowski sempre quis cursar Rádio e TV e trabalhar com comunicação. Após um ano, porém, precisou trancar o curso. “Tinha de trabalhar para pagar a universidade e nessa área não estava conseguindo nada”, lembra. De olho no mercado, migrou então para o curso de Administração, o que possibilitaria maiores opções. Hoje, Bruno trabalha em uma rede multinacional de roupas e acessórios esportivos. “Sei que não fiz a troca pelos motivos certos, mas dentro da Administração acabei me encontrando e estou muito feliz com a decisão”, diz. Mas Bruno ressalta que não desistiu da Comunicação: “Pretendo fazer especialização em gestão de marketing assim que me formar. No futuro, quero concluir também o curso de Rádio e TV, como realização pessoal mesmo”, garante. Ignorando as estatísticas e o domínio masculino dentro da Engenharia, Paloma Teles Cortizo descobriu cedo sua vocação. “Desde criança eu era fascinada por obras e construções. Na construção da minha própria casa, eu tinha apenas oito anos e conversava muito com o engenheiro, pedreiros e até ia passear em loja de material de construção e escolhia alguns acabamentos”, lembra. A única dúvida que teve, quando adolescente, era se escolhia Engenharia Civil ou Arquitetura. Cursou colegial técnico em edificações, portanto, para conhecer um pouco melhor de cada área. Hoje Paloma está finalizando o curso de Engenharia Civil na Unicamp e já planeja uma especialização em Engenharia Estrutural. “O importante é tentar descobrir a sua vocação e dar um direcionamento a ela”, aconselha. |
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