sexta-feira, maio 21, 2010

A Inovação Destruidora


A inovação se converteu no Santo Graal das economias modernas. Sejam elas a Espanha, Coreia do Sul, Brasil ou a Índia, todas estão empenhadas em repensar seus modelos de inserção internacional, procurando escalar a cadeia de valor agregado com novos produtos e processos. Desde Sokow, os economistas tampouco deixam de insistir em como a inovação, especialmente a tecnológica, é, atualmente, a fonte de produtividade e crescimento, definitivamente a principal alavanca do desenvolvimento econômico.

Existe um pequeno país, porém, que chama a atenção por ter conseguido, se não atingir, pelo menos aproximar-se deste Graal, e isso, apesar de ter muito poucas vantagens para empreender semelhante aventura. Esse país é Israel, uma economia com poucas vantagens a priori, sem recursos naturais, que sequer possui água, e cercado por potências inimigas. Ali ocorreu um milagre: Israel é hoje em dia o país com maior densidade de start-ups (empresas iniciantes) por habitante no mundo, a economia com o maior número de companhias listadas na Nasdaq depois dos Estados Unidos.

Em 2008, o investimento em capital de risco por habitante em Israel era 2,5 vezes maior do que nos Estados Unidos, 30 vezes maior do que na Europa, 80 vezes mais do que na China e 350 vezes mais do que na Índia ou Brasil. Nas décadas passadas, estima-se que foram criados mais de 240 fundos de capital em Israel. Com apenas 7 milhões de habitantes, Israel atrai mais investimentos em capital de risco do que o Reino Unido ou a França, que têm mais de 60 milhões. Gigantes mundiais como Intel ou Cisco têm hoje o núcleo dos seus centros de Pesquisa e Desenvolvimento situados em Israel. Sem esses engenheiros, muitas inovações que conseguem começar a dar seus primeiros passos no mercado mundial jamais veriam a luz do dia.

Um livro publicado recentemente procura compreender o que ocorreu nesse país (Dan Senor e Saul Singer, Start-Up Nation: The Store of Israel s Economic Miracle, Hachette Book Group, 2009). Aos que procuram impulsionar a inovação nos seus respectivos países, e nos latinos, em particular, há nele algumas experiências de grande interesse. Obviamente, há instituições que não são reproduzíveis em nenhum outro país do mundo, experiências que dificilmente poderiam se ambientar em outros contextos nacionais. Apesar disso, o papel desempenhado pela diáspora judaica no mundo, a maneira como esse Estado soube e procurou deliberadamente absorver imigrantes, como impulsionou uma política industrial alavancando-se e alimentando o capital de risco privado, são experiências que os países latinos podem aprender e nas quais podem se inspirar. Isso não diz respeito apenas aos latinos, como demonstra o exemplo recente da Irlanda, que acaba de lançar um programa de capital de risco inspirado na ex periência israelense.

Existe algo, contudo, que chama a atenção nesta trajetória e nesse afã de assumir risco, de aprender com as tentativas e os erros, com os sucessos e os fracassos, de questionar a ordem estabelecida e a autoridade, de apostar definitivamente na dissonância cognitiva. Num dos capítulos mais emblemáticos do livro, conta-se em detalhes como as equipes da Intel Israel, lideradas por empreendedores e engenheiros israelenses procedentes da Califórnia, insistiram e enfrentaram as suas autoridades na sede de Santa Clara para levar suas inovações ao mercado e para converter os processadores concebidos por eles nos sucessos mundiais mais tarde conquistados pela Intel.

O mesmo impulso de inovação destrutiva habita empreendedores como Shai Agassi, um executivo da companhia de software SAP que, depois de ter se tornado o mais jovem membro da equipe dirigente (e, para cúmulo, um não-alemão), demitiu-se para mergulhar numa aventura totalmente destruidora: no propósito de transformar o mundo num "lugar melhor" para viver, ele simplesmente se propôs a liquidar a indústria petrolífera (nefasta, na sua opinião, por contribuir para a poluição do planeta) e, para tanto, eliminar seu principal cliente, a industria automotiva. Para isso, concentrou-se na criação de um carro que deixaria de utilizar o petróleo como energia e utilizaria as baterias elétricas. O nome da sua firma? Better Place.

O exemplo de Israel mostra a qualquer país que não existe nenhuma maldição em matéria de inovação. Nem mesmo a escassez total impede que um país inove e se beneficie das tecnologias mais avançadas. Tampouco existe um DNA que impeça inovar: afinal de contas, a nação israelense se constituiu à base de ondas maciças de imigração procedentes de todos os rincões do mundo, de países distintos como Rússia, Etiópia, Polônia ou da África do Norte.

A partir desse ponto de vista, não há nada que impeça que qualquer país latino, por exemplo, se converta numa nação inovadora. De fato, se tomamos uma região como a América Latina, por exemplo, como mostra um relatório prestes a ser publicado, o Innovalatino, fruto da colaboração da escola de negócios Insead com o centro de Desenvolvimento da OCDE, com o apoio da Fundação Telefônica, existe um centro importante de inovação em processos industriais e uma profusão de criatividade empresarial em toda a região (desde a inovação logística de um Cemex até a criatividade gastronômica de um "chef" como o peruano Gastón Acurio, os exemplos abundam).

É possível que a partir daqui se possa aprender mais com a experiência israelense, que seja possível inspirar-se em formas de capitalizar mais o capital humano das diásporas latinas (em particular, as estabelecidas nos Estados Unidos e na Europa), acionar mais fundos de capital de risco e, acima de tudo, fomentar ainda mais uma educação eficiente, com centros de engenharia ou de gestão de excelência mundial, bem como uma educação mais propensa a favorecer esse espírito de dissonância cognitiva e destrutiva que parece residir em cada israelense, e isso, seja qual for a sua procedência, europeia, africana ou americana.

Fonte: Javier Santiso, professor, ESADE Business School

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